Como tornar o turismo urbano mais sustentável na Europa pós-Covid

Edited on 10/01/2022

As cidades URBACT estão a contribuir para um estudo da UE, a ser lançado em breve, sobre uma melhor regulamentação do arrendamento de curta duração para turistas.

 

 

Com a retoma do turismo, um grupo de cidades URBACT está a apoiar os esforços para melhorar a regulamentação do arrendamento de curta duração para turistas na UE. A sua experiência servirá de contributo para um estudo sobre turismo sustentável para a Parceria para a Cultura e o Património Cultural da Agenda Urbana para a UE (AUUE). Laura Colini, perita do Programa URBACT, e Ugo Rossi, do Instituto de Ciência Grand Sasso (IT), partilham os seus conhecimentos...

 

O turismo urbano é um daqueles fenómenos que, antes da ocorrência da pandemia, suscitou debates apaixonados sobre a sua sustentabilidade. A transição pós-pandemia representa agora uma oportunidade única para uma reforma profunda do modelo de desenvolvimento económico existente, especialmente das suas manifestações mais controversas.

Este artigo apresenta um estudo em curso de implementação da Ação 1 sobre turismo sustentável para a Parceria para a Cultura e o Património Cultural da AUUE. O objetivo deste estudo é discutir com as autoridades municipais uma abordagem inovadora à regulamentação do setor do arrendamento de curta duração, originariamente baseada numa estratégia de três Ps: Preparar, Preservar, "Plataformisar". Preparar significa trabalhar em conjunto com as comunidades locais para prevenir o risco do excesso de turismo. Preservar significa implementar regulamentação destinada a preservar as zonas urbanas e as suas comunidades particularmente expostas ao risco do excesso de turismo. "Plataformisar" significa experimentar plataformas de arrendamento de curto prazo lideradas pela comunidade.

 

Este estudo é desenvolvido em colaboração com diversas cidades URBACT, nomeadamente as envolvidas nas redes TOURISM-FRIENDLY CITIES e KAIRÓS. Foram consultadas nove cidades localizadas em diferentes partes da Europa: cinco cidades de pequena dimensão - Cáceres (ES), Druskininkai (LT), Dubrovnik (HR), Dún Laoghaire (IE) e Rovaniemi (FI) -, três cidades de média dimensão - Braga (PT), Florença (IT) e Cracóvia (PL) - e uma grande capital, Berlim (DE). O URBACT apresentou os resultados finais num webinar aberto a todos, de aprendizagem entre pares, com participantes de cidades, institutos de pesquisa e da Comissão Europeia, no dia 4 de novembro de 2021. 

 

 

O risco do excesso de turismo

 

Nos últimos dez anos, uma indústria do turismo não regulamentada transformou o turismo urbano numa potencial ameaça existencial para um número crescente de cidades e áreas urbanas. Anteriormente, o risco do excesso de turismo envolvia um número limitado de cidades de pequena e média dimensão, em particular as cidades antigas classificadas pela Unesco (como Veneza, Dubrovnik, Rhodes, Plovdiv e Granada), mas, com o advento das plataformas de arrendamento de curta duração (ACD), este risco generalizou-se, envolvendo todos os tipos de cidades.

 

Nos últimos anos, as autoridades locais têm recorrido a uma regulamentação ativa, mais ou menos rigorosa, do arrendamento de curta duração para turistas em resultado da pressão exercida pelo excesso de procura turística sobre os residentes locais e o tecido social urbano. A regulamentação tem sido adotada de forma reativa depois das cidades e outros destinos turísticos populares terem atingido o seu limite e, em alguns casos, terem excedido os limites ambientais da capacidade de acolhimento turístico. Por diferentes razões, as iniciativas regulamentares têm sido limitadas nos seus resultados. Para além do mais, as iniciativas regulamentares existentes parecem ser especificamente de base local: localmente fragmentadas e nem sempre com o apoio do governo central.

 

 

Pandemia como um jogo de mudança

 

As restrições impostas durante a pandemia tiveram um forte impacto nas cidades e, em particular nas suas economias orientadas para os serviços, a começar pelos setores culturais e de entretenimento. Museus, teatros, restaurantes e bares sofreram muito com os confinamentos e estão agora a lutar para conseguirem recuperar após a reabertura. Além disso, a difusão do teletrabalho infligiu um golpe quase fatal a várias zonas comerciais e ao setor do retalho em geral, provocando o encerramento de muitas lojas independentes, ao mesmo tempo que favoreceu a expansão dos serviços de entrega oferecidos pelos gigantes do comércio online e pelas cadeias de retalho multinacionais.

 

No hemisfério norte, o verão de 2021 viu o turismo urbano voltar parcialmente à "normalidade". Mas a súbita retoma do turismo, e da economia do entretenimento em geral, aumenta o risco de congestionamento em áreas urbanas dotadas de atrações naturais, como acesso à beira-mar, a lagos ou a montanhas. Por outro lado, as incertezas persistentes sobre a evolução da pandemia ainda estão a agravar a crise nas cidades cujas economias se desenvolveram em torno de zonas de escritórios e de entretenimento.

 

 

Desafios e oportunidades na transição pós-pandemia

 

Apesar de toda a ambivalência do momento atual, o caminho pós-pandemia oferece uma oportunidade única para experimentar a transição sustentável no setor do turismo. Por esta razão, é importante - e urgente - pensar numa abordagem inovadora à regulamentação do arrendamento de curta duração para turistas e outros visitantes temporários.

 

Assim, assiste-se a desenvolvimentos importantes neste sentido. A Comissão Europeia lançou recentemente uma iniciativa denominada Serviços turísticos - iniciativa de arrendamento de curta duração envolvendo e consultando cidades e cidadãos, a fim de fomentar um "crescimento responsável, justo e fiável dos arrendamentos de curta duração, como parte de um ecossistema turístico equilibrado".

 

O nível local é crucial para o sucesso da regulamentação do turismo urbano. Neste sentido, acreditamos que uma estratégia inovadora de regulamentação - baseada numa abordagem mista, prescritiva e proativa às políticas públicas - tem de envolver uma vasta gama de técnicas de cocriação e de métodos participativos, tal como o URBACT implementa em todas as suas redes urbanas. O método URBACT é aqui adotado com o objetivo de alcançar uma maior responsabilidade das comunidades locais na gestão do turismo urbano.

 

 

Estudo da AUUE para testar plataformas de arrendamento lideradas pela comunidade

 

O estudo, lançado no âmbito da AUUE sobre a Ação 1, baseia-se no método URBACT, observando as práticas e experiências locais na gestão dos fluxos turísticos e os seus impactos ao nível local. Através de um inquérito distribuído às cidades das redes TOURISM-FRIENDLY CITIES e KAIRÓS, e às cidades da parceria da AUUE, o estudo avalia e testa estratégias para a gestão do setor do arrendamento de curta duração de base local e lideradas pela comunidade. As cidades selecionadas representam diferentes tipos de turismo urbano: enquanto algumas ainda não viram o turismo urbano atingir o seu limite, outras estão dispostas a investir mais na contenção dos riscos relacionados com um mercado desenfreado de arrendamento de curta duração para turistas.

 

Por exemplo, a cidade de Braga (PT) regista um aumento considerável de turistas e está a analisar estratégias que permitam uma melhor convivência entre os residentes locais e a presença temporária de turistas. A cidade de Cáceres (ES) tem uma abordagem seletiva ao arrendamento de curta duração, ou ACD, uma vez que a legislação regional lhe permite controlar o arrendamento de apartamentos turísticos. Colaborando com Braga e Cáceres na rede TOURISM-FRIENDLY CITIES, a cidade de Cracóvia (PL) esforça-se por preservar a sua comunidade de residentes de longa duração no centro histórico da cidade.

 

O estudo da AUUE está a testar o interesse e a disponibilidade das cidades selecionadas para experimentar plataformas de arrendamento geridas localmente e lideradas pela comunidade. Os três princípios seguintes estão no centro desta experimentação:

  • Planeamento antecipado: na política de turismo, uma abordagem de antecipação procura evitar a reprodução de um risco sistémico como o excesso de turismo na sequência de um evento perturbador, como a pandemia de coronavírus;
  • Envolvimento comunitário: cultivar um sentimento de pertença à comunidade local significa abraçar uma abordagem ao turismo que coloque as necessidades da comunidade no centro das estratégias políticas locais empenhadas na diversificação económica e num metabolismo urbano sustentável;
  • Capacitação municipal: o turismo centrado na comunidade requer uma nova estratégia institucional centrada no poder municipal. A escala local é crucial não só do ponto de vista do impacto social e da implementação de políticas, mas também em termos de capacitação institucional das comunidades locais.

 

 

Observações finais

 

A súbita interrupção do turismo imposta durante a pandemia permitiu ao público desenvolver uma distância crítica em relação ao modelo de desenvolvimento económico que agora tendemos a associar à chamada "normalidade", incluindo o turismo urbano - em particular o setor do alojamento turístico mediado por plataformas online.

 

Ao avaliar a diversidade das realidades locais e pontos de vista sobre o turismo urbano, o desafio da AUUE é aproveitar a oportunidade, à medida que o setor do turismo recupera da crise provocada pelo coronavírus, para reiniciar a gestão municipal do ACD sob uma nova perspetiva. O objetivo é dar voz às cidades URBACT e da AUUE na conceção de melhor regulamentação a adotar futuramente para o setor de arrendamento de curta duração na UE.

 

 

Leitura adicional:

 

 

Autores: Laura Colini, Perita do Programa URBACT, e Ugo Rossi, Instituto de Ciência Grand Sasso (IT)

Fotografia da capa da autoria de Eugene Kuznetsov em Unsplash

 

Versão inglesa submetida por Laura Colini, a 18 de outubro de 2021

 

Submitted by Maria João Matos on 10/01/2022
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Maria João Matos

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