O que é o Ru:rban? Hortas urbanas, democracia, inclusão e sustentabilidade ambiental
O município de Loures é um dos 7 parceiros desta rede de transferência liderada pela cidade de Roma. O foco do Ru:rban é o desenvolvimento de comunidades saudáveis e inclusivas a partir da operacionalização de hortas urbanas comunitárias de produção de legumes biológicos, para autoconsumo - ferramenta de inclusão e sustentabilidade ambiental nas áreas urbanas, assente em práticas democráticas e participativas para o envolvimento dos cidadãos e diversos stakeholders da comunidade.
Os munícipes de Loures desde há longos anos têm vindo a praticar agricultura urbana nos espaços vazios da cidade, de forma espontânea, e, por vezes, desordenada, em terrenos privados ou de propriedade municipal; noutros casos, de forma muito organizada, aproximando as memórias da cultura rural à urbana, lançando sementes para novos caminhos e soluções. O município, em resposta a esta procura, na última década foi desenvolvendo projetos piloto pontuais de hortas urbanas, em que alguns deles já introduziam o modo de produção biológico.
Os desafios? Modelo de governança, gestão partilhada multistakeholder
Ao surgir o convite, Loures viu no Ru:rban uma oportunidade para responder ao apelo dos cidadãos e para criar um modelo de gestão e governança participativo, uma estratégia e um regulamento universal à escala do município, para as hortas urbanas comunitárias do seu território.
Considerou-se importante aproveitar as parcelas municipais desocupadas com aptidão para a horticultura urbana e a forte procura dos cidadãos com vontade de participar, generalizar o uso do modo de produção biológico, envolver as associações locais e a comunidade diversa e multicultural, implementar a visão de Roma, que introduz práticas comunitárias na gestão de parques hortícolas.
Foi definido aplicar, à partida, em dois anos, a boa prática de Roma em três locais do território, com dinâmicas sócio económicas distintas: Hortas Comunitárias do Conventinho; Hortas comunitárias do Bairro da Petrogal; Hortas comunitárias dos Terraços da Ponte e Quinta do Mocho.
Como fizemos? Inspiração transnacional, adaptação à realidade local, ao tempo de pandemia.
De um balanço de quase 2 anos de projeto Ru:rban, aplicando ferramentas e técnicas da metodologia URBACT, no processo de transferência, é possível perceber que nem todas funcionaram sempre da melhor forma, mas, ainda assim, podemos apontar aspetos muito positivos. Estabeleceu-se um Grupo de Acão Local (ULG) para envolver os stakeholders (especialistas, gardenisers/hortelãos, uma equipa municipal multidisciplinar, associações locais, escolas e a academia, entre outros) que reúnem pontualmente, com geometrias variáveis, e debatem as ideias chave do projeto. O ULG inclui especialistas com conhecimento na área da economia, ambiente, agricultura biológica, urbanismo, ciências sociais e comunicação, bem como hortelãos. Os passos e as atividades desenvolvidas foram organizados em três dimensões: 1. Capacitação em gestão e organização de hortas urbanas e produção em modo biológico; 2. Formação de gardenisers; 3. Regulamento e modelo de governança.
O Plano de Transferência da Cidade, elaborado com a contribuição do ULG, farol de referência e carta de navegação do projeto, definiu objetivos à escala local. Foi também avaliado, com frequência, o progresso das atividades de todo o processo de transferência com a elaboração de reuniões virtuais, quadros síntese e apresentações periódicas que permitiram fazer reflexões intermédias.
A inspiração, quer das cidades parceiras nas reuniões transnacionais, quer das reuniões do ULG e associações locais, dos gardenisers/tutores hortelãos e dos hortelãos, ao longo do processo de transferência, tornou possível o intercâmbio e a aprendizagem ao nível local, levando a encontrar novas soluções conjuntas e a construir uma nova visão sobre hortas urbanas comunitárias.
O que fizemos em tempo de pandemia? Resiliência, cautela e proatividade
A incerteza e as restrições impostas pela pandemia COVID-19 foram um desafio adicional, resultando num atraso no exercício de transferência e levando ao alargamento do prazo do projeto até junho de 2021. Contudo, introduziram-se reuniões virtuais, adaptaram-se as atividades de acordo com as regras de segurança para a saúde, garantindo o avanço do projeto.
Em fevereiro de 2020 chega da cidade de Roma a notícia da pandemia e colocam-se algumas questões: quanto tempo vai durar? Como prosseguir o projeto? Como nos adaptamos? O que fazer? A partir de março, em Loures, o normal ritmo do programa de formação em agricultura biológica foi interrompido temporariamente, tendo ficado dificultados os encontros entre os horticultores. O envolvimento e partilha de atividades entre o município, as escolas, a comunidade local e os horticultores sofreram uma drástica redução. Houve inicialmente uma pausa e adiamentos de reuniões, mas rapidamente se retomaram as reuniões do ULG via remota, à semelhança das reuniões da rede, estimuladas pelo perito de rede URBACT e pelo parceiro-líder do projeto.
A formação seguiu as regras de segurança anti COVID-19. Foram transmitidas aos horticultores e afixadas nas hortas regras consonantes com a Autoridade de Saúde, permitindo o acesso às hortas comunitárias, porque os legumes são seres vivos e não podiam deixar-se morrer! Os procedimentos complicaram-se, mas a vontade, disponibilidade e disciplina de todos permitiu dar continuidade ao trabalho desenvolvido durante o primeiro ano do projeto.
Sucessos alcançados? Sinergias criadas, aspetos potenciados no território de Loures
Destacamos que até agora o Ru:rban:
- levou a um envolvimento crescente dos políticos da cidade e à valorização da importância da horticultura urbana para criar dinâmicas de sustentabilidade; é disto exemplo o testemunho de Bernardino Soares, presidente da Câmara Municipal de Loures:
- integrou um plano estratégico ao nível do concelho que prevê o envolvimento dos cidadãos nos processos de planeamento urbano, por forma a garantir a existência de espaços verdes na cidade, para todos os cidadãos deles se apropriarem;
- incrementou conhecimento e valores e capacitou as partes interessadas: horticultores, gardenisers e associações locais parceiras, por forma a criar um modelo de gestão de hortas urbanas comunitárias democrático e participativo. Houve impactos muito positivos a nível individual, institucional e nos membros da comunidade envolvidos, de que é exemplo o vox-pop de Mariana Mota/Loures ULG:
- criou a oportunidade de constituição de um ULG e de uma equipa municipal multidisciplinares. Isto significa que diferentes stakeholders no município tiveram a oportunidade de se envolver no projeto e dele se apropriarem, com entusiasmo!
Obstáculos? Maiores dificuldades e barreiras
Promover a adopção do novo modelo de governança revela-se uma tarefa dura. As barreiras institucionais e culturais, a burocracia e a pandemia não são uma grande ajuda para a mudança de paradigma.
Tradicionalmente, a gestão das hortas urbanas pressupõe a gestão direta dos espaços públicos pela autarquia. A passagem da gestão das hortas para os gardenisers, hortelãos e associações locais, antevê-se eficaz, mas obriga à alteração da cultura procedimental no município.
A reconversão dos horticultores para o modo de produção biológico é, também, uma tarefa difícil, porque implica mudança de comportamentos e discussão de crenças enraizadas.
Ainda prevalece a intenção de cada horticultor querer cultivar o seu talhão individualmente, constituindo uma barreira ao princípio do uso do solo hortícola de forma comunitária. As sementes do Ru:rban precisam de tempo para germinar.
Em resumo
Loures participa com entusiasmo nesta rede de transferência e considera excelente a liderança da cidade de Roma, bem como a partilha de experiências e produção de conhecimento entre as 7 cidades parceiras (Vilnius, Salónica, Caen, Corunha, Cracóvia, Loures e Roma).
Ao nível local, o Ru:rban tem contribuído para integrar a horticultura urbana em planos de futuro para a cidade de Loures, ampliando a rede das hortas comunitárias no concelho.
A participação no projeto excedeu as expectativas. Muito tem sido feito, particularmente no contexto da participação e implementação do conceito de gardeniser, para promover as hortas. Consideramos que o projeto está a introduzir efeitos muito positivos à escala local. A partilha de saberes com outras cidades europeias é uma inspiração poderosa que leva a grandes resultados!
Texto da autoria de Ana Luís, Project Coordinator e Marlene Marques, Local Coordinator