A cultura é mais do que criatividade, histórias e estética. É um instrumento para repensar as nossas cidades. Em toda a Europa, as cidades estão a recorrer à cultura, não apenas como fonte de identidade e inspiração, mas como um poderoso motor de transformação urbana. De cidades em declínio a capitais com grande dinâmica, os municípios estão a usar políticas culturais, o património e práticas artísticas para reativar espaços públicos, fortalecer laços sociais e estimular as economias locais.
As seis cidades apresentadas abaixo receberam o selo de Boas Práticas URBACT 2024. Cada uma delas oferece um exemplo convincente de como a ação cultural pode responder a desafios urbanos que se impõem, seja descentralizando o acesso às artes, envolvendo os jovens na vida cívica ou repensando a gestão dos bens culturais.
Descubra porque é que a cultura não é um luxo, mas a linguagem – e um direito humano – através da qual as comunidades pensam, se reconstroem e se relacionam nas cidades.
Revitalização e reativação cultural
À medida que as áreas urbanas enfrentam os desafios da desindustrialização, do declínio populacional e da desigualdade geográfica, as iniciativas culturais são cada vez mais usadas para revitalizar e reinterpretar espaços subutilizados. A seguir indicam-se dois exemplos de cidades que transformaram infraestruturas históricas – um depósito de elétricos e fortificações antigas – em marcos culturais que servem tanto as comunidades locais quanto as estratégias urbanas mais amplas.
# 1 – Wrocław (PL)
Um antigo depósito de elétricos foi renovado e transformado no Czasoprzestrzeń, um centro cultural dinâmico que reúne estudantes, artistas, ONGs e comunidades locais. Propriedade do município, o espaço acolhe muitos eventos, desde festivais de música e exposições de arte a workshops educativos e atividades humanitárias. Como vestígio industrial, o depósito atrai agora mais de 68 000 visitantes por ano e apoia talentos emergentes através de diferentes iniciativas.
Tudo isto, e muito mais, esteve em destaque durante o City Festival URBACT 2025, que decorreu em Wrocław entre 8 e 10 de abril.

# 2 – Šibenik (HR)
A iniciativa Fortress of Culture (Tvrdava Kulture Šibenik) gere cinco locais restaurados, incluindo as três fortificações históricas da cidade, como espaços culturais durante todo o ano. Sob esta instituição pública dedicada, os locais acolhem agora anualmente mais de 550 eventos, atraindo mais de 250 000 visitantes e impulsionando as indústrias criativas locais.
O que distingue Šibenik não é apenas a dimensão da sua transformação, mas também a sustentabilidade do seu modelo de governação. Através da gestão participativa, de parcerias locais e de uma aposta na educação e na inovação, a cidade transformou o património num recurso vivo que visa melhorar a qualidade de vida, prolongar a época turística e criar empregos.

Qual é a lição para a sua cidade?
A regeneração cultural nem sempre requer novas infraestruturas. Às vezes, trata-se de reinventar o que já existe. Seja um antigo depósito ou uma fortificação medieval, os espaços abandonados podem tornar-se motores da vitalidade urbana. Estas cidades mostram como investir na cultura como infraestrutura, com programação inclusiva e governança sustentável, pode desbloquear o potencial económico, o orgulho cívico e a coesão social.
Cultura para o bem-estar, juventude e pertença
Além do entretenimento ou da estética, a participação cultural está profundamente ligada ao bem-estar, à educação e ao empoderamento cívico. Cidades como Cartagena e Alessandria estão a conceber programas culturais que colocam as pessoas, especialmente os jovens e outros grupos carenciados, no centro do desenvolvimento urbano. Estas iniciativas não só oferecem acesso à cultura, como também tornam a cultura uma ferramenta para o sentimento de pertença, aprendizagem e transformação.
# 3 – Cartagena (ES)
Em Cartagena, os adolescentes e jovens adultos não são apenas destinatários passivos de programas culturais, mas tornam-se os protagonistas. Através dos Prémios Mandarache e Hache, mais de 7000 jovens entre os 12 e os 30 anos tornam-se membros do júri de prémios literários anuais, lendo livros selecionados, debatendo o seu valor e votando nos seus favoritos. Numa cidade marcada por disparidades territoriais, Mandarache tornou-se assim um elemento unificador.
Este modelo liderado por jovens criou o maior júri literário do mundo, com mais de 85 000 participantes desde 2005. Além de melhorar a literacia, a iniciativa promove a autoexpressão, o pensamento crítico e o sentido de autonomia. Workshops, debates públicos, encontros com autores e até mesmo spin-offs internacionais (no Chile e na Colômbia) transformam a leitura num ato social e cívico, ano após ano.

# 4 – Alessandria (IT)
Confrontada com o despovoamento, o declínio económico e a ausência de um teatro público, a iniciativa Theatre for All recorre ao teatro comunitário para reaproximar os residentes com a cultura e entre si. Com esta prática, o município conseguiu revitalizar áreas públicas e instalações culturais subutilizadas. Coproduz um programa anual com parceiros locais, oferecendo espetáculos a baixo custo para famílias e escolas, cursos de teatro para estudantes e reclusos e oportunidades de emprego para artistas e técnicos locais.
Em Wrocław, houve uma sessão dedicada à apresentação das Boas Práticas URBACT recentemente certificadas durante o City Festival URBACT 2025. De acordo com Cesare Torre, do município de Alessandria, que falou durante a sessão, o seu modelo «capacitou as vozes locais e reuniu as pessoas, no palco e fora dele». «Transformamos histórias em mudança social», afirma.
Esta abordagem multigeracional está a ativar não só a participação cultural, mas também a vida educativa e económica. Ao envolver escolas, universidades, associações de idosos e organizações culturais, o projeto preparou o terreno — e um público dedicado — para a futura abertura de um novo teatro público.

Qual é a lição para a sua cidade?
A cultura torna-se verdadeiramente transformadora quando é objeto de cocriação com as comunidades. Estas práticas mostram que investir nas pessoas, especialmente nos jovens, nas famílias e naqueles que estão longe dos circuitos culturais tradicionais, é essencial para promover o bem-estar e a coesão social. Seja através da literatura ou do teatro comunitário, a cultura pode dar aos residentes não apenas acesso, mas também uma voz, um papel e uma ligação mais forte à cidade.
Novas abordagens à governação, à linguagem e à participação
A cultura não se resume ao que acontece no palco ou nas galerias de arte. Tem também a ver com a forma como as decisões são tomadas, quem pode participar e os modelos que sustentam o setor cultural. Cidades como Múrcia e Dublin estão na vanguarda da transformação da governação e das políticas, criando ecossistemas culturais mais transparentes, inclusivos e adaptáveis.
# 5 – Murcia (ES)
Através do Cultural Reactives, Múrcia renovou radicalmente a sua abordagem à política cultural: um modelo nascido das perturbações causadas pela pandemia da COVID-19. Em vez de remendar o antigo sistema, a cidade criou um modelo totalmente novo com concursos públicos transparentes, financiamento baseado na produção, programação descentralizada e apoio direto à criação artística.

Fundamentalmente, este modelo dá prioridade aos bairros periurbanos e carenciados, redirecionando o investimento cultural para além do centro da cidade. Múrcia envolve os artistas no desenvolvimento da paisagem urbana, incorporando elementos culturais em espaços municipais e coordenando projetos artísticos com temas urbanos, como a reabilitação do rio ou instalações de luz nos seus bairros do sul.
A iniciativa também inclui Laboratórios de Cidadãos, onde as comunidades cocriam projetos que abordam temas como a solidão, a infância e a assistência.
# 6 – Dublin (IE)
A iniciativa Gaeilge365 está a redefinir a forma como as línguas minoritárias são apoiadas em contextos urbanos. Em vez de se concentrar na tradução ou no uso simbólico, a cidade pretende integrar a língua Irlandesa na vida quotidiana, desde festivais de rua e projetos para jovens até serviços públicos e comércio a retalho.
A abordagem baseia-se na ciência comportamental, na sociolinguística e na cocriação em comunidade, com mais de 10 000 novas oportunidades para falar em Irlandês em espaços públicos criados em apenas um ano. Apoiado por uma forte legislação nacional, o programa combina programação cultural com experimentação política. Inclui liderança juvenil, aprendizagem intergeracional e um esquema de parceria no comércio a retalho que liga o uso da língua ao crescimento económico local.

Qual é a lição para a sua cidade?
A cultura prospera quando é apoiada por uma governação inovadora. Seja repensando modelos de financiamento, envolvendo novos públicos ou incorporando direitos culturais nas políticas públicas, cidades como Múrcia e Dublin mostram que as mudanças significativas começam nos bastidores.
A cultura é benéfica para as cidades e, sim, também pode pagar as contas
O que liga uma fortificação em Šibenik, um prémio literário liderado por jovens em Cartagena e um programa teatral em Alessandria? Cada uma destas ações reflete a forma como as cidades continuam a colocar a cultura no centro da transformação urbana. Estas seis Boas Práticas URBACT mostram que a política cultural vai além de uma boa programação, trata-se de governação, identidade e inclusão.
Elas lembram-nos que a cultura pode ser uma resposta estratégica ao declínio urbano, à fragmentação social e à incerteza económica. Podem impulsionar as economias locais, criar empregos e sustentar comunidades. Em última análise, estas práticas mostram o que é possível quando a cultura é tratada como infraestrutura essencial.
Quer mais ideias e inspiração para a sua cidade? Explore as 116 Boas Práticas URBACT premiadas em 2024, que vão da cultura ao clima, da mobilidade à inclusão.
Fique atento a mais atualizações! Algumas destas práticas serão em breve transferidas para outras cidades quando os resultados do recente convite à apresentação de candidaturas para as Redes de Transferência forem anunciados em outubro.
Traduzido do original submetido em 06/08/2025